OS JORNALISTAS
PRECISAM APRENDER A OUVIR - A gigantesca massa humana que foi às ruas reivindicar
mais qualidade de vida no ano passado obrigou-nos a refletir sobre o melhor modelo
de como levar informação da luta social ao cidadão brasileiro. É como se nosso ofício
diante daquela fratura exposta tomasse de 7 X 1. O impacto dos protestos repercutiu
nas mídias local e global. Na ocasião, a imprensa foi duramente criticada.
Talvez um pouco menos que governantes que não conseguiram melhorar os seviços
de transporte, saúde, educação e segurança do país. O movimento popular entrou
para a história e provavelmente demorará muito tempo a se repetir.
O reflexo é sentido
até hoje. Foi um bom momento para transformações. Mas ele foi desperdiçado.
Esperava-se inovações nas práticas democráticas na nossa relação com a
sociedade. É frustrante constatar que elas não vieram. Nem por parte da estrutura
política e nem pelo modelo de gestão da Comunicação.
Paralelamente,
a "Mídia Ninja" e as ações dos black blocs partiram para o confronto
e suas ações desencadearam mudanças na forma de cobertura de manifestações
públicas. Principalmente da maneira como os repórteres sempre cobriram estes
eventos. Ficou perigoso identificar o profissional com o veículo de comunicação
a que ele pertence. Os repórteres foram descobrindo aos poucos, e de
repente, que ocupar as ruas era muito perigoso. Alguns se intimidaram. Nosso
dever é o oposto. Jornalistas têm a obrigação de estar justamente onde não se
quer que eles estejam. Levar a notícia é parte inerente da vida de quem jurou
se dedicar a este ofício.
Neste momento, estamos
mal parados. Nos últimos 15 meses, assistimos impassíveis a multiplicação do
"Jornalismo Biquíni", aquele que "mostra coisas interessantes,
mas esconde-se o essencial". O jornalismo tornou-se partido político
e o jornalista torna-se notícia. E ainda pensa que isso é o certo. Não é. Antes
de tudo isso, já se reclamava que a imprensa publicava a acusação sem devida
apuração. Quantas vezes ouvimos que a denúncia ganha destaque na capa e o
desmentido é publicado no rodapé da página interna.
Não é de hoje que nos
acusam de destruir reputações. Tom Wolfe, colega ilustre, já disse isso certa
vez: "Só existem duas maneiras de fazer carreira em jornalismo.
Construindo uma boa reputação ou destruindo uma". Um
dia um empresário me disse com toda a educação: "Por que quando realizo um
evento importante no meu hotel vocês não citam o nome do estabelecimento? Mas
se tiver um incêndio num quarto o nome do hotel é estampado na capa em letras
garrafais?".
Precisamos parar de
apontar o dedo em riste para quem julgamos ser os culpados. Jornalista não
prende, não realiza inquérito, não julga. Jornalista deve informar tudo o que é
pertinente ao fato. Não existe neutralidade,e sim, isenção. Notícia não tem
somente dois lados, e sim vários. Em alguns casos, incontáveis.
Jornalista
está se achando mais importante do que ele é. E com esta falsa convicção
estamos sendo conduzidos para o cadafalso.
Esta
longa introdução é para chegarmos até uma conclusão simples: nós, jornalistas,
não gostamos de ouvir. Não sabemos ouvir. Não aceitamos críticas. Somos
arrogantes mesmo que não pensemos isso de nós. Talvez porque sejamos tão
ludibriados, enganados por fontes maldosas e presos a horários perversos, que
já partamos do princípio que estamos certos.
Por
não termos paciência com o outro, mesmo que este "outro" seja a fonte
que alimenta nosso "produto", estamos multiplicando este "ebola
da arrogância" para as novas gerações de profissionais. E o grave é que os
meninos que estão chegando são filhos de uma escola deficiente, com má formação
cultural, educacional e intelectual. E o mais grave, essa turma diz
detestar política. Arrisco dizer que a maioria sequer sabe a diferença do que
faz um deputado para um senador.
Nas redações, nossos
templos de trabalho, os jornais de papel e as revistas raramente são abertos.
Nada é lido. Os garotos dizem que esse hábito é para idoso. O aparelho de TV
fica ligado num só canal. Por isso se tem uma visão única. Neymar disse que
jogadores brasileiros têm preguiça de treinar. Jornalistas têm preguça de ler.
O rádio, veículo sempre atual, é algo alheio à "cultura" da nova
geração.
Mas
será que os focas não se informam pela internet? Falso. A esmagadora maioria
prefere trabalhar no ar condicionado, não circular onde está a notícia, não
andar pelas ruas, não conversar pessoalmente com o povo. Se pudessem escolher a
opção, seria navegar nas redes sociais. Os jovens curtem basicamente o que
circula no Facebook.
O
compromisso primário da profissão: "Para quem trabalho? Para que serve meu
ofício? Dedicação máxima para levar informação para quem não tem, ser útil aos
pobres" são utopias. Na verdade, estamos caminhando para algo
parecido com o que fez o mocinho de o "Planeta dos Macacos". Seu
laboratório gerou uma nova espécie de símio.
O problema de não
sabermos ouvir as ruas está nos empurrando para o descrédito. A imprensa
surtou. Ao mesmo tempo que se chama ativistas sociais de vândalos, também é
permitido chamá-los de jovens. Depende da ocasião. O pêndulo vai para um lado
ou para outro conforme interesse específico. As redações que outrora
abrigava o pluralismo da sociedade hoje é reduto da velha direita. Aqueles que
fizeram 1964 podem se orgulhar. Seus filhotes cresceram, ganharam musculatura.
A direita venceu.
Vamos ouvir mais a opinião
pública e menos a publicada. Antes que seja tarde.
(Texto de Sidney Rezende publicado no blog SRZD)