Viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe.
PARA-QUEDAS DO CORAÇÃO – Hoje assisti no Arpoador parte das filmagens da biografia de Cazuza. A produção do filme construiu uma cópia do Circo Voador para fazer as cenas de época. Foi tudo muito emocionante para mim. O ator que faz o papel de Cazuza estava bem parecido com ele nessa época. Inclusive vestido com uma camiseta listrada igual a que o Cazuza adorava usar. Eu fazia parte do mesmo grupo de teatro do Cazuza e convivi com ele bem de perto no período do circo no Arpoador. O circo em frente ao mar, o ator igual ao seu personagem e os figurantes caracterizados me deixaram com uma nostalgia muito grande dessa época.
O nosso grupo de teatro chamava-se Corpo Cênico Nossa Senhora dos Navegantes e o espetáculo que montamos, o único, chamava-se Pára-quedas do Coração. Era uma comédia musical, uma paródia do filme A Noviça Rebelde. Nós adorávamos fazer o espetáculo e o público se divertia. Ensaiamos meses e meses no Parque Lage. O espetáculo mudava o tempo inteiro. Nós éramos garotos e não tínhamos pudor nenhum. Então fazíamos loucuras em cena. E o público adorava.
Foi uma época de efervescência cultural. E nós vivemos essa época com muita intensidade. Praias maravilhosas no posto nove. Noitadas loucas no baixo Leblon. Porres. Alta velocidade. E muita aula de teatro. Tínhamos disciplina e empenho. Ensaiávamos com muita disciplina apesar dos porres, das drogas e das noitadas. Também foi uma época de sexo saudável. Ainda não existia AIDS então o sexo era praticado sem nenhuma paranóia, sem preocupação.
Na época do grupo de teatro o Cazuza namorava outro ator da peça, Sergio Maciel, o Serginho, que nós chamávamos de Sergio Kinski, por causa da atriz Nastassia Kinski. Serginho era um menino lindo, parecia um príncipe encantado de contos de fadas. Eles formavam um casal lindo. Jovens, lindos e enamorados. Entre idas e vindas eles foram namorados a vida inteira.
Certa vez, depois de um ensaio, o grupo foi beber chope no Baixo Leblon. Bebemos feito loucos, conversando, trocando idéias, falando bobagens. E sempre tinha rolado um clima entre mim e o Cazuza. Nessa noite aflorou uma atração e nós começamos a nos beijar. Um beijo na boca apaixonado dentro da Pizzaria Guanabara, na frente de todo mundo. Foi um escândalo. Então ele se levantou e disse que ia me levar em casa. Entramos no carro e o Cazuza completamente doido saiu dirigindo a toda velocidade enquanto eu ficava agarrando ele. Chegando em casa fomos direto para o quarto e nos jogamos em cima da cama. Fodemos a noite inteira.
Depois dessa noite, apesar de ser namorado do Serginho, toda vez que tinha oportunidade a gente repetia o programa. Ele gostava de trepar comigo e eu tinha muito orgulho disso. Nunca chegamos a ficar grandes amigos, mas gostávamos um do outro. Logo depois desses acontecimentos ele começou a ficar famoso e passou a andar com outras pessoas então perdemos o contato. Mas sempre que a gente se encontrava ele fazia questão de ser carinhoso comigo. Ver o Cazuza hoje, na porta do Circo Voador, como a vinte anos atrás, foi emocionante para mim. Que bom que eu vivi tudo aquilo. Fiquei cheio de tesão pelo garoto que faz o seu papel no filme. De todas as lembranças que eu tenho do Cazuza a que eu guardo com mais ternura é a lembrança do seu beijo. Ele gostava de beijar. E quando a gente transava sempre ficávamos muito tempo se beijando.