VANITY FAIR - O fascinante mundo do jornalismo é descrito com muita percepção no livro COMO FAZER INIMIGOS E ALIENAR PESSOAS. O jornalista Toby Young descreve num estilo que eu chamaria de impiedoso sua temporada como funcionário da Condé Nast onde foi editor da revista VANITY FAIR. Seu editor chefe Graydon Carter é descrito como um tirano, vaidoso e emergente. Ele cita algumas máximas do seu chefe:
Você pode editar uma revista com uma máquina de escrever ou uma calculadora, mas não com ambas.
Não cometa o equívoco de pensar que o anunciante é o cliente, porque não é, o cliente é o leitor.
O importante não é quem você põe na revista, e sim quem você deixa de fora.
A seguir um irresistivel trecho do livro.
A força de trabalho da Condé Nast não mudou muito desde que Sam Newhouse comprou a companhia em 1959. Em sua ampla maioria, é ainda composta de WASPs, judeus e um diversificado conjunto de europeus. Há alguns ítalo-americanos, alguns asiático-americanos e até uma borrifada de afro-americanos, mas no todo eles têm muito pouca influência. A única mudança realmente significativa dos últimos quarenta anos é a ascensão dos homossexuais.
Na Condé Nast, os editores-chefes tendem a ser heteros, mas os departamentos de arte, os departamentos de fotografia e até mesmo os departamentos da moda são cidadelas gays. Quando se trata de questões de gosto, questões que vão desde as roupas que devem ser usadas em matérias sobre moda a que fotógrafos devem fotografar as capas, os homossexuais comandam o poleiro. Há revistas na América que abastecem explicitamente a comunidade gay, como Attitude, Out e Poz, mas é através de revistas ilustradas chiques, especialmente os títulos da Condé Nast, que os homossexuais exercitam o poder cultural fora de seu grupo demográfico. Numa grande proporção, eles definem o que passa por bom gosto nos Estados Unidos contemporâneo.
Um dos segredos mais guardados na Condé Nast é como o público leitor gay da revista GQ é amplo. A preocupação é que se isso se tornasse de dominio público, poderia afastar os leitores heterossexuais. No entanto, mesmo as denominadas revistas de mulheres têm seus fãs homossexuais. Uma pesquisa sobre o público leitor de Glamour realizada por Condé Nast em 1992 descobriu que 18 % dos leitores homens da revista eram gays ou bissexuais. Segundo a companhia de pesquisa de mercado que fez a pesquisa, um quinto desse grupo era de travestis procurando dicas de beleza e moda.
Durante meu tempo na Vanity Fair, frequentemente me atrapalhei por não perceber que a pessoa com quem estava falando era homossexual. Por exemplo, em certa ocasião, um colega meu me perguntou a que público leitor eu achava que Details era dirigida. (Details é uma revista de moda masculina.)
"É para homens que gostam de olhar fotos de homens nus mas não descobriram bem por quê", retorqui. Ele me olhou ferozmente com indisfarçada hostilidade. Evidentemente me faltava o olhar que permite à maioria dos nova-iorquinos identificarem numa olhadela se alguém é gay. Details é provavelmente a única revista gay do mundo que ainda está no armário. Certa vez foi exposta num episódio de The Simpsons no qual um novaiorquino diz a outro: "Que tal uma revista Details enfiada no rabo?"
No início de 96 resolvi dar o meu primeiro jantar em Nova York , para o qual convidei cinco homens e cinco mulheres. O homem sentado à minha frente, um escritor negro do Village Voice, fumava cigarros em tons pastel e, no final da noite, distraidamente peguei um e disse: "Eles são tão gays." Um silêncio caiu sobre a mesa e todos os outros comensais olharam o escritor para ver como reagiria. Eu não tinha percebido, mas ele era um importante membro da comunidade gay de Nova York, famoso por rebater com dureza exatamente o tipo de observação que eu fizera. Felizmente ele decidira não dar importência à minha frase: "Sorria quando disser isso", ronronou.
No dia seguinte, uma das convidadas ligou para me passar um pito. Eu lhe disse que simplesmente não tinha a mínima idéia de que o homem em questão fosse homossexual.
- Toby - disse ela, como se explicasse algo a uma criança -, todos os homens no seu jantar eram gays.
Em outra ocasião, um colega escriba convidou-me para sua festa "de saída do armário". Além de todos os seus amigos, todos os membros de sua família estavam presentes, inclusive sua avó judia. Depois de ele fazer um discurso à companhia reunida anunciando ser, em suas palavras, "um veado completo", recebeu três presentes: um bolo com as palavras "Bem-vindo ao lado de fora do armário" escritas em brilhante glacê cor-de-rosa e a coleção completa de Barbra Streisand.
Posteriormente me ocorreu que uma percentagem significativa dos jornalistas com quem me deparava eram gays - judeus e gays, na verdade. Dizendo isso minha intenção não é pôr combustível nas fantasias paranóicas dos críticos conservadores americanos. Mas os jornalistas para os quais eu gravitava tendiam a fazer parte daquela categoria porque eram muito mais espertos e engraçados do que todos os outros. É claro que quando percebi que a maioria dos meus amigos eram gays, eu tinha afastado a maioria deles pensando serem heterossexuais e convidando-os a partilhar meus pensamentos lascivos sobre várias mulheres: "Dá uma olhada naqueles peitos! Ela é muito gostosa, não?"
Das cerca de duas dúzias de homens que entravam nos escritórios da Vanity Fair todos os dias durante meu tempo lá, apenas quatro ou cinco eram heterossexuais. Era uma brincadeira tradicional entre Chris Lawrence e eu de que progrediríamos muito mais rápido nas fileiras da revista se fingíssemos ser homossexuais. Na verdade, cogitávamos frequentemente se os poucos membros da equipe abertamente gays não seriam na realidade heterossexuais disfarçados, uma categoria conhecida em Nova York como "Steers" - straight queers (bichas hetero).
O mais assumido homossexual que já encontrei no escritório era Kevin Sessums, o entrevistador-celebridade-chefe da Vanity Fair. No tempo de Tina Brown, ele escreveu uma matéria para Poz na qual contava como fora dormir com o neto soropositivo de George Wallace, o antigo governador do Alabama que se opusera ferozmente aos direitos civis. Quando a matéria apareceu, Sarah Giles, uma editora britânica, passou pelo corredor principal brandindo a revista por cima da cabeça e gritando "ai-meu-deus, ai-meu-deus" a plenos pulmões.
Parecer gay é um valor tão amplo na Manhattan dos dias atuais que é vantajoso até mesmo na arena dos encontros amorosos. A revista Talk publicou um artigo em maio de 2000 identificando o ingrediente mágico que torna Jude Law, Matt Damon e Edward Norton arrasadores de corações: o fato de serem "gays apenas o suficiente".