23.10.04

A LINHA DA BELEZA – O escritor Alan Hollinghurst está para a literatura inglesa assim como a dupla Pet Shop Boys está para a música pop. A escrita de Hollinghurst tem a mesma suavidade melódica aliada à mesma intensidade ideológica das canções de Neil Tennant e Chris Lowe. Um texto elegante, classudo, ao mesmo tempo fácil e puro. Seus personagens são desenhados com glamour e estilo enquanto uma trama envolvente e erótica arrasta o leitor para um mundo de prazer literário.


Na última terça feira, Alan Hollinghurst ganhou o Booker Prize, o mais importante prêmio literário da Inglaterra, com o livro A linha da beleza, lançado em 2004. Pela primeira vez, em 36 anos de existência, o Booker Prize foi concedido a um romance de temática homossexual. Tem isso alguma importância? O importante é que Mr. Hollinghurst é um escritor especial. Da mesma tradição de Oscar Wilde e E M Forster, ele utiliza as prerrogativas de sua condição homossexual para descrever e criticar com muita classe o mundo e o tempo em que vive.


A biblioteca da piscina é o único livro de Alan Hollinghurst publicado no Brasil, lançado em 1999 pela editora Record. Uma encantadora obra-prima carregada de humor e gosto pela vida. O romance narra o cotidiano do jovem aristocrata William Beckwith na Londres da primeira metade dos anos 80. Mr. Beckwith não precisa trabalhar e pode dedicar sua vida a saborear os pequenos e grandes prazeres. A boa comida, a melhor bebida, o culto às artes e ao seu esporte favorito: a pegação. O protagonista adora freqüentar a piscina de um clube antigo, onde costuma observar os corpos nus dos outros homens quando eles estão no vestiário.


Um belo dia, quando está fazendo pegação num banheiro público de um parque londrino, Wiiliam salva a vida de um bicha velha, que escorrega e bate com a cabeça na parede azulejada. A vítima é um Lorde decadente, ressentido e mau humorado, que acaba se afeiçoando a William e o pede para escrever sua biografia. Enquanto pesquisa a vida daquele senhor, o protagonista repensa sua vida e seus relacionamentos amorosos com James, um médico bem sucedido e Artur, um jovem negro bonito e pobre. A biblioteca da piscina é um livro encantador, que tem a jovialidade e a fluência narrativa de um bom filme do James Ivory. A seguir, um trecho do livro:




Eu já ia dar meia-volta para ir embora quando reparei em um rapaz árabe solitário vagando por ali, com as mãos nos bolsos do seu anoraque, sem nada de notável, mas algo nele despertou em mim o sentimento de que eu devia possuí-lo. Estava convencido de que o rapaz me tinha visto e eu experimentava uma deliciosa exaltação de luxúria e contentamento em face da idéia de ir trepar com ele enquanto um outro rapaz esperava por mim em casa. A fim de testa-lo, fiquei fazendo hora atrás do quiosque, onde alguns banheiros, excessivamente freqüentados por homens solitários de meia-idade, encontram-se espremidos à margem da rua principal, encoberta pela hera e pela sombra dos pinheiros. Desci a escada de azulejos, entre as paredes de azulejos, e um aroma higiênico, surpreendentemente agradável, me cercou. Tudo era muito limpo e em diversos cubículos, sob os canos de cobre polido (de cujo brilho alguém devia se orgulhar bastante), homens se achavam de pé, as capas de chuva ocultando do visitante inocente ou do policial desconfiado suas demoradas travessuras. Senti uma leve repulsa – não um sentimento de desaprovação, mas o temor de um dia vir a me tornar como eles. Suas cabeças me pareciam grisalhas e desprovidas de amor quando se voltaram para mim em um movimento automático de expectativa. Que investimento enorme haviam feito para, depois, obter apenas um lucro tão desprezível...

Será que eles se cumprimentavam, com suas mãos envelhecidas, quando, dia após dia, tomavam suas posições ao lado uns dos outros na estação do metrô que porventura seu circuito pelos sanitários públicos houvesse alcançado? Será que alguma coisa acontecia, será que eles, desistindo do que quer que procurassem ali, e que de modo algum poderia ser sexo, mas no máximo uma visão de relance de algo memorável, será que eles alguma vez acabavam ficando mesmo uns com os outros? Eu tinha certeza que não; eles estavam totalmente empenhados, com uma silenciosa cumplicidade muda, em procurar incansavelmente algo que não podiam ter. Eu não era tímido, mas sim demasiado orgulhoso e petulante para tomar meu posto ao lado deles, e foi após um só momento de hesitação que resolvi não fazer isso.





Para ingressar na alta sociedade é preciso ou alimentar, ou divertir, ou chocar as pessoas. Oscar Wilde


CAFÉ SOÇAITE – A jornalista e locomotiva social Hildegard Angel promoveu um coquetel de boas-vindas para o estilista Ocimar Versolato que, na noite anterior, inaugurou uma grande loja na Rua Barão da Torre, em frente a Praça da Paz. A recepção de Hildegard foi no MIX, o novo restaurante de Ricardo Amaral e Alexandre Accioly, que fica ao lado da loja. O MIX é ponto de encontro de ricos e famosos. Hildegard, que é um festeira nata, dessas que não perdem um coquetel, nem um casamento elegante, nem uma badalada reunião social simplesmente não pôde ir à festa que ela mesma estava promovendo. O falecimento de um amigo de infância a levou, no dia da festa, a um ritual de despedida na cidade de Juiz de Fora.


Mesmo sem a presença da anfitriã, a festa transcorreu num alto nível de animação. Sabendo que a amiga não poderia estar presentes, Gisela Amaral assumiu o controle e recepcionou as personalidades do society carioca que atenderam ao convite de Hildegard. Gente rica e poderosa, com suas mais caras jóias, suas roupas de grife e seus reluzentes carros importados. Jair e Marisa Coser, Lou de Oliveira, Bia Rique, Raquel Alt com Tonhão, Narcisa Tamborindeguy, Tânia Caldas, Sandra Habib, Claude Amaral Peixoto, Vicente Mantuano, Marcelo Faustini, Carlos Alberto Serpa, Fausto Stuqui, Ricardo Amaral, Alexandre Accioly e Michele, Lenny Niemeyer, Ariadne Coelho, Leleco Barbosa e Maninha, Bianca Teixeira, Sylvia de Castro, Jaqueline Brito e Mario Canivello, só para citar alguns.


O evento estava marcado para às oito da noite e, os mais ricos, chegaram pontualmente. O primeiro andar do MIX foi fechado para a recepção. Lá dentro o farfalhar das sedas, o tilintar das taças de champanhe e vinho, e chacoalhar das pedras de gelo nos copos de uísque, risos, gargalhadas e gritinhos arrematados com ohs! e uhs! O DJ tocava apenas o que se convencionou chamar de lounge: o tema do filme Aeroporto, Frank Sinatra, Jonhny Alf, Burt Bacharach, Marvin Gaye e outras pepitas que pareciam feitas para combinar com as jóias das granfinas, que fizeram a delícias dos fotógrafos das revistas Caras, Contigo e Flash. A chegada de Ocimar Versolato foi triunfal. Como ele era o homenageado, demorou um pouco a chegar. Mais sua entrada no salão não poderia ter sido mais gloriosa. Ao seu lado estava sua musa inspiradora Sônia Braga.


Sônia Braga não poderia estar mais linda. Deslumbrante com um fechativo modelito Versolato e seus longos cabelos negros emoldurando o rosto cada vez mais belo. Clic. Clic. Clic. Os flashes dos fotógrafos deram mais excitação à noite. Todos os granfinos queriam uma foto ao lado de Sônia. Foi então que eu percebi que todas aquelas dondocas do society também tinham um lado Gabriela. Ou seria A dama do lotação? O fato é que Sônia não teve um minuto de sossego, fotografando, fazendo poses e distribuindo seu carinho e seu bom humor com todos os presentes.


Passei a noite inteira tomando taças de um vinho chileno fantástico e trocando uma palavrinha com um e outro. “Como a Sônia está linda”, era a frase mais ouvida na noite. “Pede para o fotógrafo da coluna fazer uma foto minha com o Versolato”, me pediu uma dondoca. “Como a Sônia tem cabelo. É dela mesmo ou é implante?”, perguntava uma madame reluzindo de jóias. “A festa está ótima. Pena que a Hilde não tenha podido vir”, dizia uma jovem senhora enquanto emendava, numa gargalhada, “talvez a festa esteja ótima exatamente porque ela não pôde vir”.


“Você viu aquele rapaz bonito que está com o Serpa? É o Fausto Stuqui”, comentava uma jornalista cheia de cobiça na voz, enquanto sibilava“. Quando Leleco Barbosa passava Ricardo Amaral imitava Chacrinha e gritava: “Terezinha...” Quando eu comentei com uma senhora que estava impressionado com a quantidade de personalidades da sociedade presentes à festa, a mulher me respondeu com a voz séria. “As pessoas estão aqui porque gostam da Hilde. As pessoas estão aqui porque gostam de se reunir e encontrar os amigos. Mas, as pessoas estão aqui, principalmente, porque não querem correr o risco de deixar de atender a um convite da colunista, entrar numa lista negra e nunca mais serem citados na coluna”.


Eu estava bebendo meu vinho tinto ao lado da cabine do DJ quando La Braga se aproximou e me perguntou onde era o banheiro. Eu mostrei o caminho e, antes de se afastar ela virou-se para o DJ e afirmou: “Muito bom o teu som...” Mais tarde, quando eu conversava com Mario Canivelo e um rapaz bonitão que trabalhava no MIX, Sônia se aproximou, segurou no meu braço, disse que estava adorando aquele lugar, que o ambiente era muito simpático e que tinha curtido ver sua foto na exposição do Luis Trípoli. (Uma das paredes do lugar é decorada com dezenas de fotos do Trípoli).


Depois contou que está gostando muito morar em Niterói, que a casa que comprou para sua mãe fica num lugar muito sossegado, que ela curte passear no caminho de Niemeyer. Falou que adora comer massas no Da Vero e que o restaurante Jambeiro tem uma vista fantástica para a Baía da Guanabara. Depois a estrela brasileira descreveu os cinemas que estavam sendo construídos em Niterói. Um complexo de seis salas num shopping. Os olhos de Sônia brilhavam quando ela descrevia o cartaz do complexo cinematográfico que mostrava dois rolos de filme que giravam enquanto anunciavam os filmes exibidos.


No dia seguinte, na redação do Jornal do Brasil, o diagramador Domingos Bernardino, o Dobe, olhava encantado para as fotos de Sônia Braga, no MIX. "Como ela está bonita", dizia Domingos, com sua voz máscula e gulosa. "Sou fã da Sônia desde aquela cena em que ela subiu no telhado para soltar a pipa. Tá lembrado?"

Nenhum comentário:

Madonna vem aí...

 

Postagens mais vistas