24.1.05

O PRAZER DE LER - Carlinhos Oliveira está de volta. O cronista mais popular e polêmico do Rio de Janeiro nas décadas de 60 e 70, falecido em 1986, renasce numa antologia que inaugura uma série de volumes temáticos com textos de sua autoria que só foram publicados anteriormente na imprensa. O HOMEM NA VARANDA DO ANTONIO´S, organizado pelo jornalista Jason Tércio, é um mergulho profundo no universo da boemia da Zona Sul carioca, em que se cruzam artistas, escritores, jornalistas, intelectuais, mulheres liberadas, vagabundos profissionais e até executivos pais de família. O livro da editora Civilização Brasileira estará à venda a partir de 18 de Fevereiro.




“Ele foi andando sem assoviar, pois já não era menino. As janelas amanheciam para o trabalho, a escola, o futuro. Ele, porém, anoitecia. Foi andando e dizendo: ‘Amanhã, vida nova. Praia, ginástica, almoço na hora certa. Isto não é vida. Amanhã, vida nova’. E de repente, como um personagem de William Faulkner, refletiu que já estava no amanhã. ‘Hoje é amanhã’. E a vida nova? (...) Ele sorriu para a claridade caramelada, como fizera tantas vezes, durante tantos anos, e disse: ‘Não adianta. Não é possível. Eu gosto da noite barulhenta, escura, lenta’. E de certo modo ficou contente com a falta de sentido das coisas.”




Durante as mais de duas décadas em que trabalhou no Jornal do Brasil, entre 1961 e 1984, Carlinhos esmerou ainda mais seu texto, criando um estilo elegante, sucinto e, ao mesmo tempo, polêmico. Um escritor que funde sofisticação e coloquialismo em doses exatas em temas fundamentais na história sócio-político-cultural brasileira: o golpe de 64 e a ditadura militar, a Bossa Nova e o Tropicalismo, a revolução sexual, o processo de redemocratização do país. Movimentos vividos por Carlinhos, em suas crônicas ou na própria pele.


Com uma existência cigana - Carlinhos Oliveira não esquentava residência -, em meio ao alcoolismo, drogas e paixões mal resolvidas, o autor mergulha no universo da boêmia da zona sul carioca da qual foi porta-voz em crônicas primorosas. Ao todo foram mais de 2 mil publicadas em jornais, além de romances e contos, em que se cruzam artistas, escritores, jornalistas, intelectuais, mulheres liberadas, vagabundos profissionais e até executivos pais de família. Uma tribo que Carlinhos integrou durante mais de 30 anos.


O HOMEM NA VARANDA DO ANTONIO’S mostra como nos textos de Carlinhos Oliveira não há lugar para o pitoresco sem substância ou banais frases de efeito. Suas crônicas são quase sempre um convite eloqüente à fantasia, à reflexão ou à revolta. Ele enriqueceu o gênero adicionando um viés psicológico-existencial, perpassado de ironia e ceticismo. Por isso, o que transmitem estas páginas pulsantes de vida, encharcadas de álcool e de sensações hedonistas, vai além da atmosfera recreativa de bares, restaurantes, boates e festas - é a essência do espírito boêmio como autêntica expressão cultural da cidade e uma afirmação vigorosa da liberdade, contra a rigidez e os valores utilitários da sociedade convencional.

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