10.5.06

A ARTE DA POLÍTICA Para o Waldir, com um abraço cordial, Fernando 2006. Assim foi a dedicatória que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso escreveu no meu exemplar do livro A arte da política, durante a elegante noite de autógrafos no salão nobre do Hotel Caesar Park, em Ipanema. É Waldir com W ou com V?, me perguntou um simpático FHC quando lhe disse meu nome. Enquanto ele escrevia a dedicatória eu elogiei o livro, disse que era muito bem escrito e agradável de ler. Você acha mesmo?Que bom que você está gostando. Obrigado por ter vindo.


Uma fila enorme se espalhava pelo salão, indo até o corredor. Fãs do ex-presidente se misturavam a políticos, diplomatas, embaixadores, gente da sociedade, jornalistas e toda uma fauna de gente que cultua o poder.


Dona Rute Cardoso recebia a todos com aquele seu charme pessoal e aquela discrição tão característica de sua personalidade. Foi muito assediada durante toda a noite. Admiradores faziam questão de posar para fotos ao seu lado como turistas diante de um monumento histórico. O filho Paulo Henrique ajudava a mãe a receber os convidados do pai.


A mulher mais elegante da noite, sem dúvida alguma, era a jornalista Miriam Leitão. A pitonisa da economia brasileira vestia uma capa de chuva azul escuro, calça comprida numa cor parecida, uma blusa branca e sapatos azul e branco. Eram roupas caras. Miriam é uma mulher vaidosa, no bom sentido e, em vez de investir seu rico dinheiro em ações, papéis ou moedas estrangeiras, a analista de economia prefere investir num belo dum modelito. Miriam Leitão só anda com roupas caras. Curiosamente, ela gasta muito pouco em maquiagem. Lá no Caesar Park ela estava de cara lavada e parecia muito bonita fazendo esse estilo.


Miriam Leitão foi uma das poucas pessoas que recebeu especial atenção de dona Rute Cardoso. As duas ficaram um bom tempo tricotando e a ex-primeira dama pareceu ter ficado muito contente com a presença da jornalista na festa de seu marido.


Quem também marcou presença na noite de autógrafos foi o charmoso candidato gay ao governo do Rio Eduardo Paes. De paletó e camisa social sem gravata ele circulou pelos salões, trocou cochichos com uns e outros, cumprimentou FHC furando a fila, mas não pegou seu autógrafo. Certamente, FHC já devia ter autografado um exemplar para ele durante o lançamento de sua campanha ao governo do Rio. Literalmente, Eduardo Paes foi ao Caesar Park apenas para dar uma pinta...


Eu fui sincero com FHC quando disse que o seu livro era muito bem escrito. Já havia até comentado sobre isso aqui mesmo no blog. Leia a seguir um trecho de A arte da política. Um capítulo batizado de O tempo não perdoa.





O TEMPO NÃO PERDOA – Hesitei em escrever um livro a respeito do Brasil que incluísse minha experiência como Presidente. Primeiro, porque talvez se espere de um ex-Presidente um livro de memórias ou, se ele tiver experiência acadêmica, uma análise aprofundada das questões nacionais. Sempre tive implicância com a idéia de escrever rememorações pessoais, autobiografias e coisas assemelhadas. Parece pretensioso e corre o risco da subjetividade, conduzida para fazer o autor sair-se bem na pose histórica. Além disso, não falta quem diga que sou vaidoso. Imagine-se o que diriam se me dedicasse a escrever autobiografia. Pelo menos neste caso valha a boutade, que já me deu tanto trabalho, de dizer que sou mais inteligente do que vaidoso, e afaste-se de mim este cálice.


Bem que tive vontade de ser mais memorialista do que sociólogo.Gravei impressões quase todos os dias em que exerci a Presidência. Quando o cansaço impedia esse exercício diário, registrava dois ou três dias depois minhas observações e sensações. Devo a Celina Vargas do Amaral Peixoto a sugestão de fazê-lo. No inicio do governo ela me deu um caderno de anotações, junto com uma página fotocopiada do diário, até então inédito, de seu avô, Getúlio Vargas. Logo percebi a maior praticidade de ditar a um gravador as impressões em vez de escrevê-las com minha letra de médico, difícil de decifrar.


Não tenho, por outro lado, disponibilidade de tempo para elaborar uma análise acadêmica e bem documentada do processo político e das transformações pelas quais o Brasil tem passado nestes últimos vinte anos. Refiro-me tanto ao tempo real (as pressões do dia-a-dia do mundo contemporâneo e as específicas de um ex-Presidente) quanto ao imaginário: aquele que a distância infinita da morte faz de seu desperdício um gozo. Comecei a escrever este livro aos 72 anos e agora, aos 74, termino esta Introdução. Não posso mais dar-me ao luxo de imaginar, parafraseando obliquamente Vinicius de Moraes, que a vida seja infinita enquanto dure. Essa sensação de infinitude é um consolo para as rupturas. A mais trágica de todas é a da própria existência. Constrangedora, cruel, inevitável. Só os loucos, no entanto, não a tomam em conta.


Ulysses Guimarães repetia que o tempo não perdoa quem não sabe trabalhar com ele. Por essa razão, tomei algumas decisões práticas. Primeiro deixarei as gravações para serem analisadas posteriormente, por quem possa interessar-se em ver como as sensações percebidas por quem está exercendo o governo são (ou podem ser) distintas daquilo que de fato acontece. E também como os motivos e os objetivos de quem toma decisões podem ser muito diferentes do que pensam ou dizem a imprensa, as outras pessoas, ou mesmo os políticos. Isso não quer dizer que deixarei de consultar esses registros. Mas não os usarei sistematicamente.


Sonhei que, deixando a Presidência, teria que vagar para voltar aos arquivos do Congresso, às atas de reuniões de governo, enfim, à documentação necessária para imitar, guardadas as proporções e sem a pretensão de comparar, o que Joaquim Nabuco fez com o pai, o senador José Thomaz Nabuco de Araújo (1813-1878), governador de província, senador e ministro, em Um estadista do império. Para isso seria preciso ter havido de verdade um estadista na República. (Fernando Henrique Cardoso)

Madonna vem aí...

 

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