A VERDADEIRA TROPA DE ELITE – O Exército brasileiro, tão injustiçado, incompreendido e desvalorizado nos dias que correm, acaba de receber uma bela homenagem do cinema brasileiro. Trata-se do filme PQD, um documentário sobre jovens soldados do Grupamento de Pára-quedistas do Exército. Um filme divertido e comovente que revela um belo e original retrato do povo brasileiro. PQD, sigla da palavra pára-quedista, é uma jóia rara. Uma obra-prima. Um filme mágico, que merece figurar entre os melhores documentários do cinema brasileiro.
O filme
PQD acompanha, durante um ano e meio, o cotidiano de jovens que entram para o Exército na esperança de serem admitidos como pára-quedistas. O filme retrata a convivência dos jovens no quartel, os sonhos de cada um, os exercícios físicos, as crises, os momentos de alegria, as decepções e as vitórias. Ao mesmo tempo os soldados são filmados na sua vida privada: a casa, a família, a namorada. E, ao fazer isso, o filme exibe um inusitado painel do povo brasileiro, exatamente a camada mais pobre da população. O bacana é que PQD não os mostra como coitadinhos, sem perspectivas, abandonados pelo sistema como faz a maioria dos nossos filmes. PQD retrata pessoas pobres, de origem humilde, mas que sabem muito bem o que querem. Têm desejos, ambições e estão dispostos a batalhar por isso de forma honesta. E esse aspecto é que torna PQD um filme interessante e digno de nota.
PQD se detém mais profundamente na história de oito soldados. Eles mesmos contam suas histórias de vida, às vezes ao lado dos familiares, às vezes sozinhos. Tem o caso do soldado Leandro, um rapaz lindo, que é criado pela avó. A mulher conta que o pai do soldado estava se preparando para ser padre, quando uma garota muito assanhada invadiu seu quarto e o seduziu. “Ele queria ser padre, mas também era homem. Deu apenas uma e engravidou a moça”, diz a mulher, arrancando risadas do público. A garota engravidou e a mãe do seminarista pegou o rapaz para criar, enquanto o pai dele seguiu o sacerdócio. “Eu sou avó e mãe dele”, diz a mulher com doçura, recebendo o carinho do neto-filho, na humilde sala de sua casa.
Noutra seqüência muito bacana um soldado aparece chegando em casa, depois de uma semana de treinamentos. A câmera mostra a rua esburacada, a casa simples que ainda está sendo construída, os poucos móveis. No entanto, há uma dignidade naquele ambiente. Isso fica mais claro quando chega a mãe dele e a câmera flagra o encontro entre os dois. O orgulho dela ao ver o filho militar e a felicidade dele por estar fazendo a mãe feliz. Depois a mulher fala do filho e diz que foi por causa dele que ela largou a bebida e a prostituição. Que desde garoto ele dava conselhos para ela, dizendo que a vida deles ia melhorar. E que agora ela via que estava melhorando. É impossível conter as lágrimas nesse momento.
Há também o caso do soldado Jhoseph Ferreira. O nome dele se escreve assim mesmo: Jhoseph. Um rapaz lindo. Uma coisa deslumbrante. Um galã do subúrbio que parece ter saído de um filme do Visconti. É o Alain Delon da Baixada. Seu semblante tem uma aura de ternura, de bondade. Ao mesmo tempo sua expressão denota firmeza, masculinidade. Eu seria capaz de escrever um blog inteiro só falando do charme irresistível do soldado Jhoseph. Poucas vezes o cinema brasileiro teve um galã com o carisma e o charme viril desse pára-quedista do nosso Exército. Quando surge na tela ele é puro cinema. É sonho, fantasia e desejo.
No filme Jhoseph é o soldado que dá certo. As cenas em que aparece em casa, ao lado do pai, são muito engraçadas. Ele é o sujeito que batalha pelo seu sonho, participa dos treinamentos, dá um duro danado, mas consegue vencer. São muito bonitas as sequências em que eles dão os primeiros saltos de pára-quedas gritando mamãe. No final do filme o belo Jhoseph aparece como um vencedor, recebendo uma nova turma de soldados. E isso é que é interessante. O filme acompanha a trajetória de todos os soldados. Alguns, por razões diversas, são dispensados pelo Exército ao final de um ano e meio. Um deles, que não teve muita sorte, dá um depoimento emocionado: “Eu nunca vou esquecer tudo o que eu vivi no quartel. Eu posso até ter deixado de ser soldado, mas eu nunca vou deixar de ser um PQD”.
Lágrimas, lágrimas, lágrimas...
A noite de estréia
Os soldados do Grupamento de Paraquedista foram a grande atração da festa de lançamento do filme PQD no Festival do Rio. Os astros do filme compareceram ao Cine Odeon au grand complet, ou seja, fardados. Os soldados Jhoseph Ferreira e Tiago Santana, os galãs do batalhão, estavam arrasadores com suas fardas de gala. Wagner Moura? Marcelo Anthony? Fabio Assunção? Esqueçam essa gente. Eles não significam nada diante da beleza expressionista e do talento natural dos soldados Jhoseph Ferreira e Tiago Santana. Se vivos, Visconti e Pasolini me dariam razão...
O público que lotou o Cine Odeon foi recebido pela Banda do 25. Batalhão de Infantaria que tocava desde temas militares, canções como Lili Marlene, até o tema do seriado Bonanza. Aqueles jovens soldados, rapazes simples do subúrbio, nunca vão esquecer essa noite. A noite em que eles foram os astros. Os artistas de cinema. As figuras mais importantes. Os protagonistas. Afinal os flashes dos fotógrafos eram apenas para eles. Havia uma fila enorme de espectadores ansiosos para vê-los na tela. E os curiosos da turma do gargarejo, atrás das grades que formavam o cercadinho em frente ao Odeon, sem entender a presença de tantos militares por ali. Alguns soldados foram acompanhados da mãe, do pai, ou da namorada, que não conseguiam disfarçar o orgulho. Dentro da sala escura a emoção foi grande. Afinal, o público vibrou o tempo inteiro com o filme. Sorriu e deu gargalhada quando os rapazes se fizeram comediantes. E se comoveu quando o filme os flagrou sentimentais, vivendo a vida de peito aberto.
PQD, dirigido por Guilherme Coelho, com roteiro de Nathaniel Leclery, estréia nos cinemas dia 23 de Novembro. E para provar que os pára-quedistas estão mesmo na ordem do dia, na próxima semana será exibido, também no Festival do Rio, Brigada Pára-Quedista, do cineasta Evaldo Morcazel, um outro documentário sobre os pára-quedistas militares. Pois é. Parece que o cinema brasileiro está redescobrindo o Exército.
Viva Caxias!
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