ANTI-CARNAVAL ESTÁ NAS RUAS DO RIO - Suvaco do Cristo, o bloco mais elitista do Brasil, faz desfile-relâmpago na zona sul e enterra o carnaval de rua do Rio. É um mito essa história de que o carnaval voltou com força total as ruas do Rio. Pelo que se viu nos desfiles dos blocos de carnaval do fim de semana pré-carnavalesco, o Rio de Janeiro tem muito folião para pouco carnaval. O desfile do Suvaco do Cristo foi o mais emblemático desse comportamento. Fundado e organizado por uma elite branca e burguesa da zona sul, o bloco, de uns anos para cá, só desfila pela manhã, sem divulgar o horário, para evitar muita aglomeração. Os elitistas do Jardim Botânico não gostam de se misturar com a plebe rude. O Suvaco do Cristo começou o desfile às dez da manhã e acabou ao meio-dia e meia. Foram apenas duas horas e meia de carnaval. Agora só ano que vem.
Acontece que cerca de 40 mil pessoas lotavam a Rua Jardim Botânico querendo mais carnaval do que o Suvaco do Cristo pôde oferecer. O bloco, num flagrante exemplo de falta de espírito carnavalesco, abandonou seus foliões, recolheu os instrumentos e foi embora deixando a multidão órfã daquilo que é o alimento do carnaval: a música. No melhor da folia, quando o público estava no auge da animação, acabou o samba. A multidão sem som tentava se virar como podia. Foi então que entrou em cena um rapaz chamado Nélio Garrido, dono da Box Mil Car Áudio, uma loja de som para carros da Ilha do Governador. Sabendo da peculiar falta de música do carnaval carioca, Garrido instalou caixas de som extras na sua camionete, deixando-a com potência para animar uma multidão. Quando a minguada bateria do Suvaco abandonou os foliões e guardou os intrumentos, o mega som da caminhonete entrou em cena com a potência máxima tocando os maiores sucesso do carnaval baiano: Chiclete com Banana, Ivete Sangalo, Daniela Mercury, Babado Novo, etc. A multidão foi ao delírio. Todo mundo começou a dançar na maior animação. Subitamente, o carnaval do Rio pareceu ter ganhado mais vida e energia com a eletrificada música do carnaval da Bahia. Mas a felicidade do folião carioca durou muito pouco. Logo, homens da Polícia Militar se aproximaram do dono do automóvel e o obrigaram a desligar o som. Não adiantaram os apelos da multidão pedindo mais músicas. Os PMs afirmaram que tinham recebido uma ordem do Batalhão informando que som alto estava proibido.
Como é que é? Som alto proibido no carnaval? Isso aconteceu em pleno domingo, às duas horas da tarde, diante de uma multidão de jovens fantasiados, querendo dançar, cantar e pular. “Uma coisa dessas jamais aconteceria na Bahia”, dizia irritada a gerente de banco Carina Limeira, que completou: “Na Bahia o som nunca acaba”.
Restou aos foliões cariocas ficar andando de um lado para outro, bebendo cerveja e paquerando. As atrizes Claudia Ohana e Janaína Diniz chegaram ao desfile às duas horas e estavam indignadas com a falta de som. “Cadê a música desse carnaval, gente? É um bloco sem música”, dizia Janaína. “O bloco saiu às dez da manhã e já acabou? Isso é um absurdo. Quem estava nesse desfile?”, perguntava Claudia. Destilando bom humor, as atrizes ficaram se divertindo com o intenso movimento na Praça do Jóckey. “Nossa, tem cada bofe por aqui. Parece que o pessoal saiu da academia e veio direto para o samba. Ou melhor, para a falta de samba”, dizia Cláudia Ohana, observando o desfile de rapazes malhados que circulavam no pedaço.
Muitos foliões que não conseguiram brincar no Suvaco resolveram tentar o desfile do Acadêmicos do Vidigal, no Leblon e, ao chegar lá, outra decepção. O Acadêmicos do Vidigal era um bloco com uma bateria de meia dúzia de gatos pingados e um carro de som improvisado num automóvel. Os percussionistas eram heróis buscando dar dignidade a uma folia que se arrastava. Em volta, uma multidão tentava arrancar um batuque daquela bateria, que não tinha a menor condição de animar um carnaval com tamanha quantidade de gente. O que salvou o pré-carnaval da zona sul no domingo foi um evento chamado Verão Tim, no Jardim de Alá, onde o DJ Gustavo Tatá ficava tocando música eletrônica para a multidão que não conseguiu abrigo no samba do carnaval de rua. Mesmo assim, João Sem Dedo, um moço bonitão da rua Farme de Amoedo se queixou aos amigos. “O som dessa rave tá muito baixo”. Definitivamente, o carnaval do Rio precisa aumentar o som.
O carnaval do Rio ainda não descobriu uma coisa que há décadas revolucionou o carnaval da Bahia: a eletrificação do som. Que me perdoem os puristas, mas o carnaval carioca precisa se eletrificar. Não dá para ficar mobilizando multidões com o som acústico das baterias. Todo ano é a mesma coisa. A falta de música e o som baixo são as maiores queixas dos foliões que brincam nas ruas do Rio. "O desfile do bloco Escravos da Mauá durou apenas uma hora e meia. Depois a música acabou e as pessoas ficaram bebendo e conversando, fazendo uma social. Acho que faltou música, mas mesmo assim foi divertido", disse o professor e ator Valter Marcelo, folião fiel ao seu bloco. “A Banda da Barra também acabou super cedo. Quando o carnaval estava começando a pegar fogo os músicos agradeceram a atenção e deram boa noite. Foi muito frustrante”, diz Anderson Almeida sobre o desfile do seu bloco favorito na Avenida Sernambetiba. No desfile do Simpatia é Quase Amor foi a mesma coisa. “Só quem tava perto da bateria é que conseguia ouvir o som. Tava uma guerra para chegar lá perto”, comentava na praça do Jóckey um folião vestido de mulher. Evoé!
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