CONTROLE REMOTO – A Rede Globo
anuncia para os próximos meses um remake da novela O Rebu, um clássico
indiscutível da televisão brasileira, escrita pelo dramaturgo Bráulio Pedroso.
Mas acho que a Globo deveria deixar os seus clássicos descansarem em paz. Seria
mais lógico reprisar a versão original. O autor do remake, George Moura,
poderia escrever uma novela original, e não descaracterizar uma obra-prima de
um dos maiores autores da TV brasileira, como aconteceu com a novela Saramandaia,
que deve ter feito o Dias Gomes se revirar em seu túmulo. Acho uma falta de
respeito com os grandes autores. Dias Gomes nunca foi um novelista qualquer.
Era uma espécie de Gabriel Garcia Marques da TV. Mas o remake de Saramandaia o
tratou como se ele fosse um roteirista de Malhação. Agora, depois do desrespeito à
memória do Dias Gomes, a emissora se prepara para violentar a memória de
Bráulio Pedroso, um autor que foi um dos responsáveis pela modernização da
nossa telenovela.
Bráulio Pedroso estreou em Beto
Rockfeller, sem nunca antes ter trabalhado na TV. Como chegou sem os
vícios dos antigos novelistas, acabou escrevendo uma novela revolucionária, que
conquistou ótimos índices de audiência e mudou a história da teleisão. Depois, ainda
na Tupi, escreveu a novela Super Plá, estrelada por Bete Mendes, uma de suas atrizes favoritas. Sua terceira novela, O
Cafona, já foi produzida na Globo. Estrelada por Francisco Cuoco e Marília
Pêra, O Cafona pode muito bem ser definida como “um Beto Rocfeller com produção
global”, já que era, praticamente, uma versão mais refinada e mais bem
produzida de sua primeira novela.
Bráulio Pedroso gostava de
revolucionar. Suas novelas sempre tinham novidades. Fosse no texto, fosse na
narrativa, fosse nas situações que criava. Nas novelas dele sempre havia algo
de original, de surpreendente. E com O Rebu não foi diferente. Era uma trama
policial cujos 112 capítulos aconteciam durante uma festa onde uma pessoa foi
assassinada. A novela abandonava o ritmo da narrativa tradicional do folhetim e exigia uma reflexão do telespectador.
O título O Rebu foi tirado da
coluna do Ibrahim Sued, que, nos anos 70, criou essa expressão para noticiar as
festas citadas na sua badalada coluna social. Quando noticiava as festas dos personagens
de então, Didu e Tereza de Souza Campos, Carmem Mayrink Veiga, Ionita Sales Pinto, Renato e Kiki Carvaglia, Paulo Fernando e
Regina Marcondes Ferraz, e tantos outros, Ibrahim escrevia que “o rebu de
fulano de tal foi um sucesso”. Rebu era apenas uma corruptela da palavra
“rebuliço”, que significa agitação, confusão. Como a novela de Bráulio Pedroso
acontecia durante uma festa da alta sociedade carioca, a expressão soou
perfeita para ser o nome da novela.
(Aliás, todas as novelas do
Bráulio tinham um mesmo princípio: era sempre a história de um homem comum, simplório, um homem do povo
que, por um motivo qualquer, acabava se envolvendo com pessoas da alta
sociedade. Ele era um mestre em escrever sobre ricos e famosos. Assim foi em
Beto Rockfeller, Super Plá, O Cafona, O Bofe e O Pulo do Gato. No caso da
novela O Rebu, o personagem em questão era vivido por Lima Duarte, o personagem
Boneco, um assaltante que entra de penetra na festa, visando assaltar o cofre
da mansão e acaba se envolvendo num crime muito mais cabeludo).
Uma das coisas mais interessantes
dessa novela é a maneira como o autor Bráulio Pedroso chegou à trama principal,
que resulta no crime que movimenta a novela. Bráulio já estava preparando a
sinopse de sua novela, já tinha resolvido que seria uma história policial, que
haveria um crime e que a história ia acontecer durante uma festa. Mas ainda não
sabia quem seria a vítima, quem seria o assassino, nem a motivação do crime.
Estava nesse dilema, quando a atriz Bete Mendes, que viria a ser a protagonista
de sua história, sofreu um grave acidente de automóvel.
Bráulio Pedroso adorava Bete
Mendes. Ele a tinha lançado em sua primeira novela, Beto Rockfeller, onde fazia
o papel de Renata, a namorada suburbana do protagonista. A mocinha passava a
novela inteira sendo enganada pelo anti-herói, que se passava por rico e vivia
seduzindo granfinas da alta sociedade paulista. Bete era linda e doce e sua
personagem cativou o público, não só por sua beleza e carisma, mas principalmente por causa do tema musical que o autor
escolheu para ilustrar suas cenas, a canção francesa F. Comme Femme, de Adamo,
uma música que faz sucesso até hoje. Vale lembrar que Beto Rockfeller, por
decisão do próprio Bráulio, foi a primeira novela da TV brasileira a ter música pop em sua
trilha sonora. E isso foi uma das razões do sucesso da novela. Bráulio levava
seus próprios discos para compor a trilha que tinha músicas como "A Whiter Shade
of Pale", do Procol Harum, "I Started the Joke", com Bee Gees e até "Here, There
and Everywhere", com Beatles.
Mas, voltando a Bete Mendes,
depois do sucesso de Renata, ela continuou na Tupi. Fez Super Plá, a novela
seguinte de Bráulio Pedroso e outras produções da época como Simplesmente Maria
e O meu pé de laranja lima. Foi ainda na Tupi que Bete Mendes conheceu Denis
Carvalho. Os dois se apaixonaram, começaram a namorar e acabaram casando. O casamento foi muito
feliz no início. Mas, ainda casado com a Bete, sem que ela soubesse, Denis
começou a namorar o Marco Nanini. Denis e Nanini se tornaram amantes.
Um belo dia Denis Carvalho, Bete
Mendes e Marco Nanini decidiram viajar, de São Paulo para o Rio, de automóvel.
Tinham compromissos profissionais na cidade. Bete já desconfiava da “amizade”
dos dois atores. E no meio do caminho, conversa vai, conversa vem, ela cobrou
uma posição dos dois sobre o relacionamento deles. Denis e Nanini abriram o
jogo. e contaram para ela que estavam mesmo tendo um caso. Então os três começaram a discutir enquanto viajavam em plena Via Dutra. A discussão evoluiu para uma gritaria e troca de acusações. Num momento de fúria, pelo sentimento de estar sendo traída, Bette Mendes
avançou sobre o volante do automóvel, que era dirigido pelo então marido, aos gritos:
“Suas bichas! Agora vai morrer todo mundo!” Denis ainda tentou segurar a onda,
mas ela estava furiosa e virou bruscamente o volante. Resultado: o automóvel derrapou e capotou várias vezes em plena Via Dutra.
Denis e Nanini tiveram apenas ferimentos leves, mas Bete, que havia provocado o
acidente, ficou gravemente ferida.
“Em sociedade tudo se sabe”,
diria Ibrahim Sued, o colunista social que criou a palavra “rebu”...
Bráulio Pedroso ficou comovido
com o drama da atriz que ele tanto admirava. E quando ela se recuperou do
acidente decidiu convida-la para ser a protagonista de sua novela. Com o
episódio do acidente de Bete Mendes, Bráulio Pedroso não só resolveu a questão
da atriz principal de sua novela. O acidente também concedeu ao autor elementos
fundamentais para a criação da trama
principal da novela: a vítima, o assassino e a motivação para o crime.
Silvia, a personagem que Bráulio
escreveu para Bete em O Rebu, era uma moça da alta sociedade, que vivia um
triângulo amoroso como aquele que a atriz tinha vivido na vida real. Silvia
namorava Cauê, um jovem bonitão de baixa renda, que acaba sendo adotado pelo banqueiro Conrad Mahler, uma bicha velha e poderosa que adorava um bofe. Ciente que o bonitão estava em dificuldades financeiras, ele o convida para morar em sua cinematográfica mansão no Alto da Tijuca. A socialite fica indignada e resolve dar o troco na tal festa. E é esse triângulo
amoroso que conduz toda a história.
Conrad Mahler está dando uma
grande festa para uma princesa italiana. Ao mesmo tempo, disfarçadamente, a
festa também é um pretexto para ele apresentar Cauê a alta sociedade como seu
companheiro. Era assim que se fazia antigamente, quando não havia essa obsessão careta com o casamento gay. Era tudo muito discreto.. Silvia, obviamente,
não foi convidada para a festa. Mas ela vai mesmo assim. “Eu não preciso de convite
para vir numa festa da sociedade carioca”, diz ela, uma espécie de Narcisa Tamborindeguy
mais jovem, mais bonita e menos doida, quando lhe pedem convite na entrada. Sem
ser convidada, ela passa a festa inteira infernizando a vida do namorado Cauê
com ironias, piadinhas, insinuações e venenos. O mesmo ela faz com o anfitrião
Conrad, a “tia velha”, que vai ficando cada vez mais irritado com a moça, até
que, num dado momento, ele perde a paciência, dá uma porrada nela, ela bate com
a cabeça e cai morta dentro da piscina.
O acidente com Bete Mendes também
serviu para definir o visual da personagem. Ela, que sempre teve cabelos caídos
nos ombros, como toda boa mocinha das telenovelas de então, surge em O Rebu com
um cabelo curto. É que, por conta do acidente, ela teve que fazer uma neurocirurgia
e precisou raspar a cabeça. Além dos cabelos curtos, o visual de Silvia, como
figurinos, jóias e maquiagem, foi todo calcado em cima da personagem de Mia
Farrow no filme O Grande Gatsby, que havia feito sucesso dois anos antes nos
cinemas brasileiros, na primeira versão estrelada por Robert Redford. Aliás, a
própria festa da novela, tinha a pretensão de ser como uma das festas
retratadas no filme inspirado no livro de F. S. Fitgerald.
Sensacional! Veja a seguir, cenas da novela o Rebu.
2 comentários:
Só vc mesmo para saber estas histórias saborosíssimas!!! Como este babado entre Bete, Denis e Nanini, e a paixão de Marina por Gal, sempre num contexto oportuno e nunca de fofoca gratuita. Seu livro de contos eróticos é maravilhoso. Seu fã, Edson.
Waldir, amei! Não sabia de metade dessas histórias que permearam a novela,rs Aliás, não gostei muito da trama quando passou.Talvez porque fosse ainda muito novinha e preferia as tramas açucaradas de então.Beijos
Postar um comentário