4.7.21

Christovam de Chevalier: poesia para todos


 


POESIA EM TUDO - Uma comovente narrativa sobre a fragilidade humana diante da peste que se abateu sobre o planeta. São dias terríveis. Dor, sofrimento e nenhuma luz no fim do túnel.  Sem perder a elegância, o senso ou o equilíbrio, Christovam de Chevalier faz um poderoso registro da vida frente à tragédia da pandemia. Em seu novo livro, “Inventário de esperanças e outros poemas”, que está chegando às livrarias, o autor conta o que viu e o que tem vivido nesses dias estranhos. A cada novo trabalho se mostrando um poeta cada vez mais refinado, Chevalier surpreende e comove ao transformar a dor e a agonia desses tempos assombrosos em pepitas raras em forma de versos e estrofes. Com o olhar de um historiador atento ao mundo à sua volta ele não deixa escapar nada. O susto, a dor, a amargura, a solidão, o pavor, a perplexidade. Sem medo de ser lírico, em tudo e em todos ele descobre um motivo para fazer poesia. Cada momento de perplexidade lhe serve de inspiração para traduzir a vida real em versos de palavras buriladas.

Um dia, quando essa época terrível for apenas uma lembrança perdida no tempo, o livro de Chevalier poderá ser lido como o inventário de uma época em que a humanidade viveu como se estivesse na terceira guerra mundial.

“Inventário” é um livro cheio de vida, mas a morte é um personagem que está sempre à espreita. Como tem sido na vida desses perturbadores anos 20. E assim, num capítulo com clima de Sociedade dos Poetas Mortos, ele celebra alguns que já partiram deixando um rastro de poesias como herança: Caio Trindade, Marcos Vinícius Quiroga, Aldir Blanc e Jorge Salomão.

Na quarentena imposta pela pandemia, que o levou a passar uma temporada numa fazenda no interior de Minas Gerais, ele criou versos que transmitem ao leitor o clima gostoso da vida no campo e o aproxima de Drummond,  mito definitivo dos poetas brasileiros.

Em seu esperançoso inventário, Chevalier encontra uma razão poética para todos os sentidos da vida. Há poesia na tragédia política em que vivemos, no circo que nos lembra que a vida é um sopro e nos singelos sopros de vida que a existência nos concede. Há poesia na saudade dos amigos que partiram, nos amores que nos alimentam a alma e no lirismo escondido das pequenas coisas do cotidiano.

Saborear a obra poética de Christovam de Chevalier é uma experiência literária fascinante.

 

 




canto de misericórdia


Há em mim uma prece

que precisa ser escutada.

Algo que, mudo, fenece

como a alma fustigada.

Há em mim uma prece

aguda, clara, bianca

céu anil que escurece

vala aberta na garganta.

Há em mim uma prece

não uma nem duas; mil

algo que me fortalece

imenso como o Brasil.

Canto que anoitece

que de mim resvala.

Há em mim uma prece

que ecoa desvairada. 









Namorados de Minas Novas

Alheios à vida e ao mundo
os jovens namoram à sombra.
O tempo é outro. Cada segundo
é um ganho a mais na penumbra.

Eles têm somente um ao outro.
Ao lado, a companhia de um cão.
Estão alheios à vida e a tudo
movidos pelo pulsar do coração.

Ignoram toda e qualquer presença
como a da mulher n’outra calçada
que precisa (e calma persevera)
de carona que a leve a sua morada.

Os dois têm um ao outro somente.
A manhã e seu fluxo não importam
(ou o vírus que ganha da Ásia o mundo
como o sangue que irrompe pela aorta).

Eles são um do outro suas escoras.
Nada mais desperta sua atenção.
O calor sufocante, o fluir das horas
o vendedor e a algazarra do pregão...

Formam os dois um único ser vivente.
Estão eles em completa comunhão.
Até que, inesperado e inclemente
um tiro os surpreende de raspão.

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