Morte no mar
Lembro do rapaz que vi morrer na praia.
Os olhos abertos– uma luz tão fria – conchas espantadas que eram.
As mãos nada diziam de
anêmonas e navios.
Eu era um menino e
o azul verde da água.
Alto e belo, o afogado,
um capitão.
Romântico
Amar noutro mundo
que não este.
Poder equilibrar – perfeito –
um prato sobre um alfinete.
Equilibrar um livro, uma casa,
sobre um alfinete.
Outro mundo. Sua maquete:
palavra e cavalete.
Outro: este, mas
em falsete. Sete vezes
mais belo, mil mais leve.
Setecentos o mesmo gesto – amar –
e, no entanto, não se complete.
Um rio que se repetisse,
um Tibete ameno, translúcido – e seu fundo,
em que não se chegasse,
era jamais a morte.
No Rio
Frias as luzes, a praça, o pátio
sob a chuva, podiam ver,
de dentro daquele aquário ao avesso,
em movimento, onde boiavam,
erravam ternuras absurdas,
breve teatro de sombras, gota
a gota luzes verticais caindo,
podiam ver, no interior daquela crônica
de amor – amor? – e desencontro,
que o motorista lia pelo espelho:
espinhos, relâmpagos, respiração.
Estavam perdidos.
Vamos pela praia,
por favor.
(Poemas de Eucanãa Ferraz)