REVOLUÇÃO DE 64 COMPLETA 50 ANOS –
As lembranças que tenho do governo militar são lembranças que estão atreladas a
minha infância. Eu era menino quando os militares estavam no auge do poder político.
Lembro que minhas tias Vasti e Virgínia me levavam para assistir a parada
militar. Elas gostavam de ver o desfile e paquerar os soldados. E eu ia junto,
menino, adorando tudo aquilo. Até hoje, todos os anos, eu vou à parada de 7 de
Setembro. E aquele sentimento de infância me bate forte quando acontece o
desfile, quando vejos os soldados marchando e a banda de música tocando o Cisne
Branco, o hino da marinha, que é uma das músicas mais bonitas que eu já ouvi.
Minhas tias diziam que comunistas
comiam criancinhas. Comiam no sentido alimentar, no sentido canibal. E isso
marcou minha infância. E não eram só elas. Lembro de outros adultos comentando,
sempre baixinho, em tom conspiratório, que os comunistas comiam criancinhas. Falavam
outras coisas horríveis sobre os comunistas, mas, o que me atingia era essa
história de que os comunistas comiam criancinhas. Eu ficava assustado e sempre
me imaginava sendo assado num espeto. “Será que eles botam algum tempero? Sal, molho
à campanha, pimenta do reino?”, eu me perguntava, nas minhas fantasias.
Havia muita ignorância sobre o que
era realmente o comunismo e essa ignorância sobre algo que não se conhecia
gerou muito conflito, muita dor, naqueles tempos. Lembro que certa vez carros do exército
pararam em frente a casa de um vizinho da nossa rua. Eles ficaram o dia inteiro
parado lá na porta, enquanto lá em casa se cochichava que eles estavam atrás do
dono da casa, que era comunista. Daí eu e meus irmãos fomos proibidos de
brincar com os filhos dele. E minhas tias pararam de falar com a mulher do
vizinho. Mas eu me recusei a aceitar as determinações dos adultos. Eu era um menininho,
mas já tinha personalidade. Continuei falando com meus vizinhos. Lembro de uma
vez que minha tia Virginia, ao me ver falando com a vizinha, me puxou rude pelo braço e me disse no ouvido,
entredentes. “Eles são comunistas e comunistas comem criancinhas”.
Essas lembranças da minha infância
me serviram de inspiração para escrever o livro Ipanema em Lágrimas, que vai ser lançado no próximo dia 20 de Fevereiro, na Livraria da Travessa, em Ipanema. É,
essencialmente, uma história de ficção sobre o governo militar, que em Março
completa 50 anos. Mas os pilares que sustentam a história são as lembranças que
tenho da minha infância, quando se dizia que comunistas comiam criancinhas.
2 comentários:
sempre arrasando,querido! muito sucesso!tertu
Voltei ("aqui é o meu lugar"...rs) após um tempinho sem acessar o seu blog e já estou amando tudo! Próxima compra; seu livro. Beijos mis!
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