27.5.07

O LIVRO É O MELHOR AMIGO DO HOMEM - Esgotado desde a década de 1980, SALGUEIRO está de volta às livrarias. O segundo romance de Lúcio Cardoso, inspirado no morro carioca de mesmo nome, foi publicado originalmente em 1935 e encerra a fase social do autor iniciada com MALEITA. No livro já estão presentes os primeiros sintomas do romance introspectivo, psicológico, que viria a ser o forte da expressão do escritor.

Ao lado de escritores como Clarice Lispector, Cornélio Penna, Octavio de Faria e Jorge de Lima, Lúcio Cardoso fazia parte do seleto grupo de escritores intimistas. Chamado pela crítica de o Dostoievski mineiro, era um atormentado. Um autor capaz, até mesmo, de contratar um assassino de aluguel para persegui-lo e, assim, mergulhar de forma mais completa no inferno de um personagem. Em outras ocasiões, chegou a convidar vagabundos que se odiavam para uma mesma festa, a fim de observar o resultado. Num meio literário acostumado à leveza e à simplicidade, Lúcio Cardoso seguiu na contramão, construindo uma literatura densa, obscura e reflexiva.

Com SALGUEIRO, a Civilização Brasileira conclui o trabalho de recomposição de alguns títulos da obra de Lúcio Cardoso. Ainda neste ano, a editora vai iniciar a publicação de traduções feitas pelo autor, entre elas Anna Karenina e Drácula.

SALGUEIRO é um romance denso e complexo, em que o morro ganha contornos de protagonista. O livro é dividido em três partes que expõem a história de três gerações de homens sem perspectivas: O avô, O pai e O filho. Ao longo da narrativa, o leitor percebe que o morro adquire vida própria, enquanto os personagens vão se descaracterizando, transformando-se em coisas. A fome e o desemprego geram uma população de miseráveis, e aqui a miséria é narrada sem meias-palavras. Em certos momentos, é difícil perceber a diferença entre os trapos, a sujeira, a lama, os cachorros e as pessoas. Tudo e todos são nivelados pela miséria.

O romance marca uma diferença bem definida entre o morro e a cidade. É significativo como o morro revela aspectos contraditórios: não são os personagens que delineiam o espaço, ou atuam sobre ele. A impressão é a de que o morro configura os personagens. Trata-se de um mundo à parte, um lugar de exilados. Ou exilados de uma vida digna. O trecho em que dois personagens vão para um hospital é notável: o branco das paredes, dos lençóis e dos móveis faz as mulheres pensar que seria impossível morrer num lugar tão limpo e imaculado.

Lúcio Cardoso nasceu em Minas Gerais, em 1913. Mais tarde, fixou residência no Rio de Janeiro, onde começou as suas primeiras experiências literárias. Além de editar duas revistas, A bruxa e Sua revista, Lúcio escrevia poesias, peças de teatro e contos. Seu primeiro romance, Maleita, foi publicado em 1934. Incentivado pela crítica, investiu em uma prolífica carreira de escritor, que resultou em romances como Luz no subsolo, Histórias de Lagoa Grande, Dias perdidos, O anfiteatro, O enfeitiçado, além de sua obra-prima Crônica da casa assassinada - que teve, em comemoração aos 40 anos de sua publicação, uma belíssima edição comemorativa lançada pela Editora Record. Em 1962, em pleno vigor criativo, Lúcio sofreu um derrame que o deixou incapaz de escrever. Morreu em 1968, após um segundo derrame.


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