16.7.05

PARIS EM CHAMAS – A festa dos bombeiros de Paris, no quartel de Saint-Germain-des-Pres, incendiou o Quartier Latin, nas comemorações do 14 de Julho. O quartel fica localizado há apenas duas quadras dos cafés celebrados por Jean Paul Sartre e Simone de Bouvoir, o Café de Flore e o Aux Deux Maggots, e na mesma rua da Igreja de Saint Sulpice, que ficou muito popular depois que o local serviu de cenários para algumas das cenas mais dramáticas do livro O Código da Vinci. O quartel também fica bem perto da rue de Buci, um lugar que eu chamaria de Baixo Quartier Latin, pois é uma espécie de centro nervoso de badalação do lugar. Ou seja: o quartel fica bem no centro do buxixo da Rive Gauche.


Quando eu cheguei na festa o quartel já estava pegando fogo. O lugar estava tão cheio que os bombeiros tiveram que bloquear a entrada do quartel. No lado de fora a animação não era menor. As ruas cheias de gente esperando para entrar. Ainda bem que, como eu já tinha ido antes ao quartel e feito amizade com eles, fui logo convidado a entrar por um soldado muito simpático que me apontou e disse: le brésilien... Como é bom ser brasileiro em Paris...


O pátio do quartel, transformado numa enorme pista de dança, estava super lotado. Em nenhum lugar do mundo, uma festa naquelas proporções receberia a autorização do corpo de bombeiros. Mas era o 14 de julho e os bombeiros franceses queriam se divertir e divertir seus convidados. Os caras dançavam no meio do público, agarravam as moças, se agarravam entre si e bebiam todas. Dois bares, um em cada lado do pátio, vendiam cervejas e refrigerantes. Num deles havia uma faixa verde e amarela onde estava escrito: BRASIL 2005. Um terceiro bar vendia apenas sanduíches e batatas fritas. Mas o lugar mais badalado da festa era o Salon Champagne, um salão com mesas e cadeiras e um bar ao fundo que só vendia champanhe. Atrás do balcão do bar uns rapazes lindos, com suas fardas de bombeiros, serviam as bebidas. Eles pegavam as garrafas de champanhe, balançavam bastante, depois a colocavam entre as pernas e em seguida abriam a garrafa, fazendo explodir o líquido espumante. Depois enchiam as taças e vendiam cada uma por apenas 2,50 euros. São tão safadinhos os bombeiros de Paris...


O DJ tocava um pouco de tudo. Ritmos exóticos, de influência africana e música latina. Mais o ponto alto da festa era o som das tradicionais músicas que animam pistas de dança do mundo inteiro: Michael Jackson, Madonna, George Michael, Village People e a trilha do filme Grease. Quando tocava essas músicas os bombeiros piravam. Subiam nos balcões dos bares e dançavam como go go boys, fazendo coreografias sensuais. Tiravam a camisa da farda e jogavam para a platéia de moças e rapazes que gritavam por eles. Uma loucura. Uma coisa do outro mundo. O que aconteceu naquele quartel foi uma catarse. Uma celebração à vida no dia nacional da França. Vendo aqueles rapazes bonitos tão comprometidos com a alegria, com a farra, com o hedonismo, eu entendia aquela necessidade de saudar a vida. Bastava ver, numa parede lateral do pátio do quartel, grafado em letras douradas, uma lista com os nomes de todos os soldados mortos em incêndios, inundações e acidentes.


Na pista de dança uma mistura de toda a fauna que freqüenta o Quartier Latin. Estudantes da Sorbonne, artistas, esportistas, executivos, turistas, existencialistas, malucos belezas, caretas, gays, lésbicas... Cada um na sua e a pegação rolando solta. Azaração, beijo na boca, mão boba, baseados... E lá no alto, duas bandeiras, do Brasil e da França, tremulavam testemunhando aquele festival de alegria.


Subindo uma escada atrás de um dos bares, uma sala vip para convidados especiais e os militares mais graduados, com suas mulheres e namoradas. O salão era todo decorado nas cores verde e amarela, com fotos de paisagens do Brasil coladas nas paredes. O piso era um enorme tapete no formato da nossa bandeira. Quando eu vi aquilo tive que fazer esforço para não chorar.


Na festa dos bombeiros aconteciam coisas o tempo inteiro. Num dado momento dois oficiais, vestidos com suas roupas de gala, surgiram no telhado de um galpão de dois andares, segurando uma réplica da torre Eiffel numa mão e na outra um sinalizador, que imitava fogos de artifício. Depois de chamar a atenção de toda a festa eles começaram a dançar uma coreografia sensual, enquanto tiravam a roupa. Um tocando o corpo do outro num ritmo provocante. Lá embaixo gritos e assobios coroavam a performance artística dos Sapeurs Pompiers de Paris.


Pena que não haviam brasileiros na festa. Pelo menos não consegui identificar nenhum. Um sujeito usando a camisa da seleção brasileira era russo. Num dado momento, quando eu estava parado no bar, cansado de tanto dançar, um francês olhou para mim e disse: Você é brasileiro. Eu olhei para ele e perguntei como ele sabia. Você tem cara de brasileiro. Então rolou o seguinte diálogo. Eu: Você conhece o Brasil? Ele: Nunca estive lá, mas gosto muito do seu país. Eu: E o que é que faz você gostar tanto do Brasil? Ele: Tudo o que eu sei sobre o Brasil me faz gostar dele. Muito em breve o seu país vai ser a nação mais importante do planeta. Eu, incrédulo: E o que é que vai fazer do Brasil a nação mais importante do planeta? Ele: O estilo de vida dos brasileiros. Ulalá...


O dia estava amanhecendo quando o DJ desligou o som. Eu estava bêbado de tanto champanhe, de tanta beleza, de tanto carinho, de tanta energia, de tanta felicidade. Fui um dos últimos a sair do quartel. E quando eu estava indo embora o mesmo soldado que havia me deixado entrar segurou no meu braço e disse com um sorriso afetuoso: amanhã tem mais... La vie en rose!





PARIS EM CHAMAS – Os fogos de artifício explodindo na torre Eiffel, durante o 14 de julho, foi apenas o clímax de uma festa que havia começado no dia anterior, já que as comemorações da data nacional francesa começam na véspera, com festas por toda a cidade. Esse ano, por causa das comemorações do Ano do Brasil na França, o charme brasileiro marcou presença em todas as comemorações. É impressionante como os franceses se envolveram com a festa. Não foi só uma promoção diplomática do governo. Existe, de forma bem clara, um envolvimento do cidadão francês com espírito da festa que homenageia o Brasil.


O show de música brasileira promovido pela prefeitura de Paris foi um sucesso. O popular jornal Le Parisien, na sua edição de 14 de julho, publicou que “mais de 50.000 pessoas dançaram ontem na Praça da Bastilha, ao som de ritmo brasileiros”, numa reportagem intitulada Bal et samba à la Bastille. Na matéria principal, que recebeu o título de Un 14 Juillet très spécial, havia um artrigo chamado um défile à la brésilienne.


O desfile foi um show à parte. Franceses belíssimos, com suas fardas de gala, exibiram o seu poderio militar com muito charme. O desfile começou com um pelotão brasileiro, formado por militares da AMAN, muito aplaudido pela multidão que se espremia ao longo da Avenue Champs Elysées. Na multidão, muitas camisas da seleção brasileira, usadas por europeus e brasileiros que estavam na Europa. Assistindo ao desfile ao meu lado, um cidadão francês com seu filho, um garoto que aparentava oito anos de idade. O que me chamou atenção é que o menino usava uma camisa com uma ilustração de uma paisagem da Bahia e embaixo estava escrita a palavra “capoeira”. Além disso, o garoto francês usava um boné verde e amarelo, onde estava escrito a palavra “Brasil”. Eu conversei com eles, que me disseram que nunca tinham vindo ao Brasil, mas tinham muita vontade de conhecer o País. “Meu filho é fã de capoeira”, disse o pai.


O desfile militar acabou com uma gloriosa exibição da esquadrilha da fumaça que coloriu o céu de Paris com fumaça verde e amarela. Quando os aviões surgiram por trás do Arco do Triunfo, um cidadão francês gritou: Les avions du Brésil! Foi uma ovação. Toda a avenue Champs Elysees aplaudindo as cores brasileiras. Foi bonito e comovente. Impossível evitar as lágrimas... Na França, quando acaba o desfile, os militares vão para os bairros da cidade, com seus veículos, tanques de guerra, etc. Então a população pode se aproximar dos soldados, visitar os veículos militares, fazer fotos e flertar com os soldados. As bandas se espalham pelas praças da cidade e fazem consertos públicos para a população. Isso me pareceu uma herança dos tempos de guerra. De fato, parece haver uma confraternização muito grande entre os militares e a população.


A TV francesa, que transmitiu o desfile ao vivo, exibiu antes do início da parada um documentário mostrando uma série de trabalhos conjuntos dos militares franceses e brasileiros, na fronteira da Guiana Francesa e o Amapá. Mostravam cenas de operações militares e ações na floresta amazônica, e entrevistas com soldados dos dois países. Depois, já ao vivo, a TV exibiu entrevistas com os militares brasileiros que iriam participar do desfile. Todas as autoridades já tinham chegado ao palanque, inclusive o presidente francês Jaques Chirac, mas Lula ainda não tinha chegado. O locutor da TV francesa então afirmou que Lula estava atrasado. “Ele deve estar pensando que é um jogo de futebol”, disse o locutor, tentando ser espirituoso. O fato é que Lula chegou em cima da hora, até porque ele não tinha a obrigação de chegar mais cedo ao evento. Na verdade o locutor estava ansioso pela presença do presidente brasileiro, para poder mostrar imagens dele e entrevistá-lo. Afinal, ele era a estrela daquele evento. O convidado de honra do governo francês. A grande celebridade do 14 de Julho. Então...


Verdade seja dita, Lula representou muito bem o Brasil no exterior. Ele teve um tratamento de estrela dado pelo governo, pela população e pela sociedade francesa. Sua saída do Hotel de Marigny, o castelo onde o governo francês hospeda chefes de estado, em direção a Sorbonne, foi gloriosa. A rua foi totalmente fechada ao transito e a transeuntes. Batedores da polícia francesa em trajes de gala cercavam a comitiva presidencial por toda a cidade. Um cidadão francês que passava no local, ao ver aquele tumulto, me perguntou: Monsieur Inácio já chegou?


Á noite, quando peguei um táxi em direção ao meu hotel, no Quartier Latin, o motorista me perguntou, quando eu disse que era brasileiro: “Como vai monsieur Lula?” Minha vontade foi dizer que Monsieur Lula era um cínico, um fraco, um presidente medíocre que permitiu que uma gangue de corruptos se infiltrasse no governo. Mas, como roupa suja se lava em casa, eu preferi dizer que ele era um grande presidente e que o Brasil tinha muito orgulho dele. O motorista de táxi começou a falar da vida de Lula, que ele tinha sido um homem pobre, toda aquela lenga-lenga romântica que cerca a biografia do presidente. Enquanto conversávamos eu olhava Paris toda iluminada, as pontes sobre o Sena, os monumentos, a arquitetura. Então o motorista me perguntou se eu estava gostando de Paris. Eu respondi que estava amando a cidade e a forma como ela era organizada. E estava apaixonado por sua beleza, sua classe e elegância. Então ele me disse, com uma certa tristeza na voz: Muito sangue foi derramado para que pudéssemos conseguir tudo isto.




PARIS EM CHAMAS - A Marselhesa é o hino nacional da França e foi composto pelo oficial Claude Joseph Rouget de Lisle em 1792, da divisão de Estrasburgo, como canção revolucionária inicialmente conhecida como "Canto de Guerra para o Exército do Reno". A canção adquiriu enorme popularidade durante a Revolução Francesa, especialmente entre as unidades do exército de Marselha, por isso ficou conhecida como A Marselhesa. Foi em 14 de julho de 1795 que a canção foi declarada como o hino nacional francês.




A MARSELHESA


Allons enfants de la Patrie,
Le jour de gloire est arrivé
Contre nous de la tyrannie
L'étendard sanglant est levé.
L'étendard sanglant est levé:
Entendez-vous dans nos campagnes
Mugir ces féroces soldats!
Qui viennent jusque dans vos bras
Égorger vos fils et vos compagnes.


Aux armes citoyens,
Formez vos bataillons.
Marchons! Marchons!
Qu'un sang impur
Abreuve nos sillons
Que veut cette horde d'esclaves
De traîtres, de rois conjurés?
Pour qui ces ignobles entraves
Ces fers dès longtemps préparés
Ces fers dès longtemps préparés
Français, pour nous, Ah quel outrage
Quel transport il doit exciter!
C'est nous qu'on ose méditer
De rendre à l'antique esclavage



Quoi! Des cohortes étrangères
Feraient la loi dans nos foyers!
Quoi! Ces phalanges mercenaires
Terrasseraient nos fiers guerriers.
Terrasseraient nos fiers guerriers.
Grand Dieu! Par des mains enchaînées
Nos fronts, sous le joug, se ploieraient.
De vils despotes deviendraient
Les maîtres de nos destinées


Tremblez tyrans, et vous perfides
L'opprobe de tous les partis.
Tremblez, vos projets parricides
Vont enfin recevoir leur prix!
Vont enfin recevoir leur prix!
Tout est soldat pour vous combattre.
S'ils tombent nos jeunes héros,
La terre en produit de nouveaux
Contre vous, tous prêts à se battre



Français en guerriers magnanimes
Portez ou retenez vos coups.
Épargnez ces tristes victimes
A regrets s'armant contre nous!
A regrets s'armant contre nous!
Mais ce despote sanguinaire
Mais les complices de Bouillé
Tous les tigres qui sans pitié
Déchirent le sein de leur mère!


Amour Sacré de la Patrie
Conduis, soutiens nos braves vengeurs.
Liberté, Liberté chérie
Combats avec tes défenseurs
Combats avec tes défenseurs
Sous nos drapeaux, que la victoire
Accoure à tes mâles accents
Que tes ennemis expirants
Voient ton triomphe et nous, notre gloire



Nous entrerons dans la carrière
Quand nos aînés n'y seront plus
Nous y trouverons leur poussière
Et la trace de leur vertus!
Et la trace de leur vertus!
Bien moins jaloux de leur survivre
Que de partager leur cercueil.
Nous aurons le sublime orgueil
De les venger ou de les suivre








PARIS EM CHAMAS - A rue de La Rochefoucauld fica perto da Igreja de Santa Rita, atrás do complexo de lojas formado pelas Galerias Lafayte que ficam perto da Ópera de Paris. É nessa rua que fica o Museu Gustave Moreau, todo dedicado a obra e ao culto desse pintor que, como disse João Carlos Rodrigues, foi cultuado por Oscar Wilde e João do Rio. O museu fica na casa que o pintor viveu com a família. No térreo, cômodos como o quarto e o escritório do artista, são mantidos como eram na época em que ele viveu. Nos dois andares de cima, os cômodos foram transformados em duas enormes galerias de arte com toda a produção do artista: os belos e intrigantes quadros, além de centenas de desenhos e rascunhos.


Mais do que um museu o Gustave Moreau é um templo de culto ao trabalho do artista, formado por imagens fortes e densas. Nos seus quadros é muito presente o conflito existente entre o profano e o sagrado. Nas pinturas sempre há algo de belo tentando se libertar de um mundo sombrio. Para muitos foi percussor do surrealismo, graças as imagens fortes que remetem a um mundo mágico que era só dele. Um mundo perturbador que fascina seus admiradores. Os desenhos são absolutamente fascinantes. Têm desde obras acabadas até rascunhos de quadros e ensaios para alguns dos quadros expostos. Vale destacar os nus masculinos desenhados em 1865 que são inspiradores.


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